Na parede da sala, o relógio. No meu pulso, percebo que ainda vivo. Eu e o cômodo sincronizamos os ponteiros. Juntos, partimos do mesmo tempo.
Eram 15:15 de um dia qualquer.
Fazia frio lá fora.
O tic-tac ressoa quando percebemos o silêncio, que logo some...
No meu peito, o coração bate, e só percebi ao ver a veia pulsando ao redor do pescoço.
Pouco a pouco os relógios se distanciam. Segundo a segundo, um se adianta e o outro se atrasa.
Eu me sinto esquisito. Estranho, o relógio na parede parece estar sentindo bem...
Do nada, sou erguido pelos braços. Permaneço imóvel. Percebo a parede, onde estava o relógio, vazia. O círculo limpo formado pela sujeira ao redor denúncia: onde está o relógio? Quem levou? Quero saber que horas são.
No meu pulso, apenas a marca esbranquiçada. Meu relógio também sumiu. Continuo subindo, agora girando no eixo longitudinal do meu corpo. As mãos invisíveis, me carregam vagarosamente em direção a parede onde estava pendurado o relógio.
O tic-tac ressoa em minha cabeça. Permaneço imóvel, não sei dizer se pelo choque do assombro de estar sendo transportado por uma força oculta, ou porque decidi ficar paralisado para ver o que a acontece: a curiosidade fez o que mesmo com o gato?
Flutuo no cômodo. Alguém que entrasse ali, ficaria espantado com a cena:
- o que você tá fazendo?
Perguntas sem sentido costumam ser feitas quando estamos diante de estranhezas como a que estou vivendo neste momento. De Repente, começo a ser transportado a solavancos, como se as mãos me empurrassem. Noto que os trancos estão perfeitamente sincronizados com o tic-tac dentro de mim.
Tic - estou de frente para porta de saída do cômodo;
Tac - minhas costas se aproximam da parede;
Tic - vejo a sombra oval de algo se esgueirar pela porta de saída;
Tac - sinto a parede fria;
Tic - o vulto sumiu;
Tac - grito de dor, parece que um prego penetrou a fina pele de minha nuca;
Tic - permaneço imóvel;
Tac - os solavancos cessam, e sou erguido, de forma como se estivessem me encaixando em algo na parede;
Tic - o buraco na nuca parou de doer;
Tac - sinto que estou encolhendo, apesar dos estalos dos ossos se quebrando, não sinto dor;
Tic - a sombra oval reaparece na porta, como se alguém quisesse espiar de soslaio, agarrado ao batente;
Tac - meu corpo se comprime cada vez mais, como estivesse se enrolando;
Tic - enfim, o dono da sombra se revela no retângulo da porta. Era o relógio;
Tac - mais um assombro;
Tic - o relógio parece estar derretendo;
Tac - eu não consigo me mover, se quer dizer uma só palavra;
Tic - o relógio está se moldando na forma humanoide, percebo pela sombra projetada no chão;
Tac - minha regressão corporal termina e sinto minha cabeça pressionada pelo resto do meu corpo, enrolado a ela;
Tic - o relógio, agora com corpo de gente, se aproxima de onde estou;
Tac - Eu me vi ali, parado de frente para o relógio de parede que me transformei;
Tic - o Eu relógio me olha;
Tac - pausa;
... Na parede da sala, o relógio. No meu pulso, percebo que ainda vivo. Eu e o cômodo sincronizamos os ponteiros. Juntos, partimos do mesmo tempo…
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Loja Provisoriamente Eterno
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Manay Deô - O Poeta Publicitário
Sou #poeta, brinco com #palavras e invento #palavrários como #redator de #poesiapublicitaria e Soul #Heterônimo criativo e #artista:
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